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Inês Aroso - Escritora

Sempre sonhei ser escritora... Aqui, sou!

Inês Aroso - Escritora

Sempre sonhei ser escritora... Aqui, sou!

Sotaque do Brasil (não, não é um texto sobre o David Carreira)

19.06.19 | Inês Aroso

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Nos últimos tempos, tenho visto no Porto cada vez mais cidadãos brasileiros a trabalharem e a fazerem parte da vida da cidade. Quando dei por mim, em poucos dias tinha ido a um brunch numa Carlotta  confeitaria brasileira com um conceito e espaço tão delicioso comos bolos que fazem, arranjei as unhas num salão brasileiro onde trabalham pessoas com um jeito extradordinário para a sua arte, almocei num espaço acolhedor e simpático como a Brigadeiria, em pleno centro da cidade, fui ver uma casa com um consultor imobiliário brasileiro, entre outras coisas.

O Porto só tem a ganhar em acolher bem os brasileiros que, por sinal, adoram viver cá e quiseram ou foram obrigados a sair do país. São estes brasileiros que nos trazem a nós, portugueses, tristes e melancólicos, a alegria, o dom da comunicação, a criatividade e aquele sotaque maravilhoso, que nos torna mais felizes. Admiro todos os brasileiros que conheci até agora a trabalharem em Portugal. Antes disso, já tinha uma amiga brasileira que vive em Portugal e que representa toda essa  sabedoria para a culinária, uma enorme coragem, imaginação e gratidão pelas coisas boas da vida.

A vida é feita de escolhas. Uns escolhem queixar-se. Outros vão à luta. E os brasileiros que eu tenho conhecido por cá vão à luta. Temos muito a aprender com eles, pois são muitos os talentos que se vão instalando pelo país e nos trazem sabor, cor e samba ao nosso amargo e negro fado.

A última dança

16.06.19 | Inês Aroso

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Naquela tarde, Alice sabia que era a última vez em que festejava algo. No fundo do coração, sentia isso, mas não queria admitir. Juntou as pessoas cujo amor e a amizade a faziam sentir feliz. Sentiu-se grata por amar e ser amada por aquelas pessoas maravilhosas. Mas sabia que não as podia cotinuar a preocupar, incomodar, entristecer ou até magoar.

Fugiu. E nessa fuga desenfreada, caiu num poço profundo e sombrio. Passaram-se dias, semanas, meses. Com frio, saltitava no poço onde caíra, mas sempre que, agarrada à escada, parecia estar quase a conseguir salvar-se, escorregava e magoava-se. Cada tentativa de subida era cada vez mais dolorosa. A cada queda, o corpo ficava mais pisado e dorido, as forças eram cada vez menores e o cansaço maior. Sempre que pedia ajuda, feria alguém que estava do lado de fora e se esforçava por a retirar daquele lugar.

Porém, um dia, o inesperado aconteceu. Quando acordou, não estava sozinha: alguém tivera a ideia de descer para a ir buscar. Alguém com um sentimento intenso mas difícil de verbalizar foi capaz de ir a um local tenebroso, para a resgatar. Alguém com inteligência para perceber que ela só conseguiria sair dali se percebesse que não estaria sozinha se caísse. Alguém com coragem para a retirar da escuridão. Alguém com a capacidade de a compreender sem a julgar. Antes de subirem, porém, os seus corpos dançaram a música que só eles ouviam. Com a magia da primeira dança e com o fulgor da última.

O super-poder de Angélica

08.06.19 | Inês Aroso

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Angélica acreditava nas pessoas. Duarte acreditava em factos. No dia em que se conheceram, Angélica acreditou que Duarte era um bom homem. Duarte acreditou que Angélica era gorda. Apesar desse facto, Duarte resolveu namorar com Angélica. Era um facto que precisava de uma namorada. Angélica apaixonou-se e pensou que o sentimento era mútuo.

Passaram 2 ou 3 anos até Duarte pedi-la em casamento. Era um facto que precisava casar. Angélica ficou feliz com o pedido de casamento e acreditou que iria viver um amor para sempre.

Duarte disse que deviam ter um filho. Era um facto que queria deixar descendência. E foi assim que, muito nova, Angélica, deu à luz um menino, a quem chamou Luís.

Duarte nunca mudou. Angélica quase que não mudava. Até que o filho de ambos, com apenas 7 anos, disse à mãe: "Mãe, porque é que deixas que o pai te chama gorda? Na escola aprendi que isso era feio... E tu também me ensinaste isso... Ele devia ir para o castigo". Angélica ficou atónita com a maturidade e simplicidade das palavras que acabara de ouvir da boca sincera de uma criança: o próprio filho. Respondeu-lhe que ele tinha toda a razão. Nessa mesma noite, pensou em todas as vezes que tinha sido humilhada, inferiorizada e insultada por Duarte. Era tremendamente infeliz e conformara-se com isso. No dia seguinte, pediu-lhe o divórcio. Ele barafustou e ela falou na liguagem dele: "Contra factos não há argumentos".

Apesar do desgosto e da ferida que demorou a curar, Angélica não deixou de acreditar nas pessoas. Isso não era uma fraqueza. Era uma atitude corajosa. Mas uma coisa mudou: passou a acreditar nela mesma em primeiro lugar. Hoje, é feliz!